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O que a Medicina aprendeu com as práticas curativas dos povos indígenas

Descubra como as práticas curativas dos povos indígenas contribuíram e ainda contribuem para a Medicina tradicional. 

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Embora sejam vistas muitas vezes como “místicas” por quem não faz parte da comunidade, as práticas curativas dos povos indígenas contribuíram e ainda contribuem para a Medicina tradicional. Isso porque, para além dos rituais envolvidos no processo de cura, seus conhecimentos sobre os recursos da natureza são muito mais profundos do que se pode deduzir em laboratório.

Das raízes às copas das árvores, dos rios aos animais, todo esse cenário é o lugar comum daqueles que sempre estiveram por aqui. É por isso que hoje vamos falar sobre como essa influência se dá no dia a dia de médicos e pacientes pelo Brasil inteiro. Confira!

Uso de plantas medicinais

Ainda em meados de 1800, o cientista e pesquisador Moisés Bertoni expressou sua admiração ao povo Guarani, afirmando que eles tinham mais conhecimento botânico do que os europeus no século XVI. Vale lembrar que eles sempre tiveram acesso à maior biodiversidade do planeta: o Brasil.

São cerca de 47 mil espécies de plantas registradas em diferentes ecossistemas. Em 2014 foi publicado o Manual de Remédios Tradicionais Yanomami, que guarda um compilado de plantas e insetos utilizados para fins medicinais com a descrição de cada espécie e dos modos de preparo.

Por que isso é relevante? Historicamente, as plantas constituem a principal fonte de novos compostos bioativos.

Aproximadamente 11% dos 252 medicamentos considerados essenciais pela Organização Mundial da Saúde (OMS) são obtidos exclusivamente de plantas. De todos disponíveis hoje, aproximadamente 40% derivam direta ou indiretamente de fontes naturais.

Vários bioativos de medicamentos antitumorais já introduzidos em tratamentos como a vincristina, a paclitaxel e o eliptínio, provém de plantas. Novos agentes para tratamento de demência e o Alzheimer, como a galantamina e huperzina-A, também são outros exemplos.

Leia também: Entenda os principais desafios da saúde dos povos indígenas

Prescrição de contato com a natureza

Demorou muito tempo para o homem branco reconhecer a importância da conexão com a natureza para a saúde física e mental. Já para os povos originários essa interconexão é natural e intrínseca de sua cultura, não sendo assim uma questão para debate.

Mas, recentemente, um estudo realizado pela Universidade de Harvard junto ao Brigham and Women’s Hospital revelou algumas provas disso. Após entrevistarem 108 mil mulheres, os pesquisadores descobriram que a taxa de mortalidade nas regiões mais arborizadas era 12% menor.

A natureza é uma fonte de cura, por meio dos bioativos, e também de bem-estar. A mesma pesquisa mostrou ser 41% menor o risco de morte em casos de doenças renais, 34% nos de doenças respiratórias e 13% nos de câncer.

Além das árvores, o que mais é benéfico? O periódico Heath & Place realizou um estudo sobre o poder que viver perto do mar ou de rios tem para reduzir o estresse.  

Outros benefícios de manter contato com a natureza já registrados cientificamente são:

  • Redução da pressão arterial;
  • Redução do risco de desenvolver miopia em crianças;
  • Melhora de quadros de depressão;
  • Melhora a qualidade da memória;
  • Aumento da concentração.

Desenvolvimento de uma visão integral da saúde

A medicina indígena é reconhecida por não tratar apenas o físico do ser humano, buscando também sanar desequilíbrios energéticos e espirituais. Uma das especialidades médicas que melhor incorporou essa abordagem holística à sua realidade foi a de Cuidados Paliativos.

Os médicos especializados nessa área se preocupam em trazer qualidade de vida à pessoa mesmo quando a cura não é possível. Assim, são introduzidas terapias cujo intuito é melhorar o quadro psicológico e emocional do paciente.

Algumas das mais comuns são a musicoterapia, acupuntura e massagem, tidas como terapias complementares. Seus principais resultados são o alívio da ansiedade, da depressão e, muitas vezes, da dor do paciente, ao promover relaxamento muscular e mental.

Saiba mais: A saúde no interior do Brasil e o exercício da Medicina

Inclusão e sensibilidade

A Medicina da Família e Comunidade também bebe da fonte dos conhecimentos indígenas. Para os povos originários, não há regras de gênero no cuidado à saúde, por exemplo, e existe mais tolerância e respeito à religiosidade.

Dessa forma, é feita uma abordagem coletiva, que considera o processo de formação de homens e mulheres para melhor acolhê-los. Seus pilares são: proteção, promoção, prevenção, cura e tratamento. Ou seja, os princípios da Atenção Primária, que está sempre no radar com prioridade.

Essa intersecção científica também acaba por influenciar a Medicina tradicional a ser mais inclusiva não apenas com pessoas transexuais, mas também com indígenas que são atendidos por médicos de outras origens. Isso é  importante tanto para povos estrangeiros quanto para as comunidades originárias do Brasil, que possuem suas próprias necessidades.

Alimentação balanceada e natural

A saúde começa pela boca, pelos alimentos que ingerimos para abastecer os nossos corpos com nutrientes, vitaminas e sais minerais. Sem eles, não há o funcionamento fisiológico ideal ou imunidade contra bactérias, vírus, entre outros agentes etiológicos.

É por isso que se defende tanto o consumo de comidas naturais, ou seja, que são menos processadas e que, portanto, não possuem tantos componentes químicos. Os alimentos orgânicos, tanto vegetais quanto os de origem animal, também são mais valorizados pela ausência de hormônios e pesticidas danosos à saúde.

Mais uma vez, estamos falando de um ensinamento que, para os povos indígenas, é intrínseco. Além da ausência de indústrias em suas comunidades e hábitos alimentares, tendo a agricultura de subsistência, a caça e a coleta como regras.

Segundo a OMS, mais de 15 milhões de pessoas morrem anualmente por conta de doenças crônicas, como o diabete e a hipertensão. Enfermidades relacionadas ao sobrepeso e à obesidade também são mais comuns nos centros urbanos, sendo relacionados ao “estilo de vida moderno”.

Hoje, nutrólogos indicam muito mais as idas ao sacolão em vez de ao supermercado. Ao comprar produtos industrializados, também é recomendado ler a lista de ingredientes para escolher aqueles com o menor número de itens possível - o que, de modo geral, representa menos aditivos químicos.

A boa notícia é que essa influência ainda pode crescer muito e para além da Medicina. Saiba como está a representatividade indígena nas universidades brasileiras.