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Quebra de patente de medicamentos: qual a sua importância para o acesso à saúde?

Entenda como e por que o Estado garante a quebra de patentes de medicamentos que ele mesmo concedeu para que todos sejam beneficiados pela inovação científica.

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Recentemente, saiu a notícia de que a Takeda perderá a exclusividade para fabricação do Venvanse – um remédio utilizado para controle do transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH). Desde então, muitas opiniões foram emitidas, mas existe uma expressão que merece destaque nesse debate: função social. Lembre-se dela a todo momento enquanto explicamos tudo que você precisa saber sobre a quebra de patente de medicamentos.

Patentes são concessões conferidas pelo Estado a inventores que desejam explorar comercialmente suas invenções. Este direito exerce um grande incentivo à pesquisa e à inovação do país não apenas na área da Saúde, mas em todas as indústrias, pois garante a possibilidade da pessoa reaver seu investimento de tempo, estudos e recursos.

No entanto, ficou estipulado que há um limite ético para essa exploração,, uma vez que os inventos trazem benefícios à sociedade e, portanto, eles deveriam ser acessíveis a uma parcela maior da população. Tanto no sentido de quem passa a poder comercializá-lo quanto no de quem o consome.

Esses benefícios à sociedade é o que se chama função social, o que no caso de medicamentos em geral fica bastante óbvia qual é. O Supremo Tribunal Federal (STF), inclusive, tem sido bastante rígido, derrubando patentes que tiveram seus prazos prorrogados para além do que já é estipulado pela Lei de Propriedade Industrial.

Agora, você provavelmente está com pelo menos duas perguntas na ponta da língua e nós sabemos quais são: como funciona essa “quebra” e o que acontece depois disso? Continue lendo para não ficar com nenhuma dúvida sobre esse assunto.

O que significa “quebrar a patente”?

Embora tenha esse nome um tanto subversivo, quebrar patentes é um mecanismo 100% legal e reconhecido no Brasil e em outros países. Oficialmente, chama-se “licença compulsória” e é prevista na Lei de Propriedade Industrial, sendo utilizada para suspender temporariamente o direito de uso exclusivo do titular de um invento.

É o equivalente a “cair em domínio público” do Direito Civil para o registro autoral de obras artísticas, científicas e literárias. Há, porém, grandes diferenças entre os prazos que precisam ser respeitados até que a licença seja concedida.

De acordo com a legislação brasileira, a perda de exclusividade sobre obras acontece após 70 anos da morte do autor ou do último coautor, que começam a ser contados a partir do dia 1ª de janeiro seguinte. Já no caso das patentes existem quatro prazos diferentes:

  • Invenção: 20 anos
  • Modelo de utilidade: 15 anos
  • Desenho industrial: 10 anos
  • Marca: 10 anos

Passados esses períodos, a quebra de patente acontece, permitindo que terceiros também produzam, utilizem, vendam ou importem o produto em questão ou todo o processo patenteado. Ou seja, no caso dos medicamentos, outros laboratórios podem produzi-los e comercializá-los com a mesma fórmula do original.

Contudo, existem exceções. Uma delas é a necessidade de quebra de patente em caso de emergência humanitária como a que vivemos recentemente com a pandemia da COVID-19.

Em 2021, foi sancionada uma norma complementar à Lei de Propriedade Industrial que concede a licença compulsória quando o licenciado não atender as necessidades do país. Isso foi feito com o intuito de aumentar a disponibilidade de vacinas contra o vírus e suas variantes.

Por que a quebra de patente de medicamentos é necessária?

Remédios mais baratos

A redução do preço dos medicamentos uma vez que a licença compulsória é concedida aos outros laboratórios acontece em função do princípio básico da economia: a lei de oferta e demanda. Segundo este princípio, a concorrência influencia os preços, pois dá liberdade às pessoas para escolher entre mais opções em vez de ficarem reféns de uma única.

Um mesmo produto, neste caso, um mesmo remédio, com características exatamente iguais podendo ser vendido por vários laboratórios faz com que eles precisem competir pelos consumidores. Assim, podem apelar à força de marca, dizendo que o seu é melhor por causa da sua reputação ou se diferenciar dos demais, admitindo um valor mais barato.

Em resumo, a quebra de patente é um mecanismo fundamental para deter monopólios e ampliar o acesso à saúde a uma porcentagem maior da população. Só para ficar claro o quanto isso é relevante, façamos uma comparação com o preço do Venvanse hoje e o poder aquisitivo médio do brasileiro.

O valor desse medicamento nas farmácias é de R$560,00 a caixa com 28 comprimidos de 50 mg, menos de um mês de uso. Em 2023, a média salarial do trabalhador brasileiro ficou em: R$ 2.979,00. Isso significa que o gasto com seu tratamento a essas pessoas representava 18% da sua renda mensal.

Mas esse nem é o pior cenário. Vale lembrar que o salário-mínimo atual é R$ 1.412,00 no Brasil e que doenças e transtornos não escolhem classe social. Logo, a compra do Venvanse representa 39% da renda de milhares de pessoas todos os meses ou mais, caso a pessoa faça uso do remédio diariamente.

Alívio sobre o orçamento do SUS

Sobre os recursos das farmacêuticas sendo rejeitados pelo STF: precisamos agradecer muito. Um estudo realizado a pedido da Farma Brasil estimou que o orçamento do SUS ficaria até R$ 1 bilhão mais caro se as patentes da marca e de outros laboratórios fossem estendidas para além dos 20 anos previstos.

Desse montando, uma boa parcela seria devido ao aumento de 60% no valor de remédios sob avaliação. Isso lembrando que foram consideradas neste levantamento apenas 39 ações judiciais que estavam tramitando à época.

Há, inclusive, um grupo de ativistas chamado Movimento Medicamento Acessível que, em 2021, trabalhou pela revogação do dispositivo que permitia esse tipo de solicitação pelas empresas. O ministro Dias Toffoli foi favorável, argumentando que o aumento do prazo ia contra o direito à saúde previsto pela Constituição Federal.

Porém, naquele ano, o Brasil e o mundo ainda se encontravam em estado de emergência devido à pandemia. Assim, até hoje, as empresas continuam entrando com pedidos de extensão na Justiça – e, felizmente, seguem perdendo.

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