O papel dos líderes no combate ao racismo no mercado de trabalho
Quer saber como identificar se a empresa em que você trabalha está comprometida com a causa antirracista? Confira aqui!
Falar sobre liberdade econômica e causas sociais como assuntos interdependentes, para muitas pessoas, soa como algo ilógico. Se você também acha que política e mercado não se misturam, vem com a gente descobrir o tamanho do impacto negativo do racismo no mercado de trabalho.
Embora representem mais da metade dos recursos humanos do país, pessoas pretas ocupam somente 29,9% dos cargos de gestão. E, mesmo quando chegam à liderança, elas recebem, em média, 22% menos do que brancos para exercer funções semelhantes.
Aparentemente, também não importa quão qualificado o profissional preto seja. Existe um déficit de 15% nos salários entre brancos e pretos com doutorado e de 23% com mestrado ou MBA. Isso é um dos resultados do racismo institucional, que, por sua vez, é um reflexo do racismo estrutural da sociedade, enraizado desde a fundação do nosso país.
Nós não somos os únicos que percebemos isso. Desde julho, executivos de 47 grandes empresas brasileiras estão participando de treinamentos sobre letramento racial para avançar o combate ao racismo no mercado de trabalho, a partir de suas organizações.
Sabe por quê? Porque já é sabido que líderes são capazes de catalisar transformações e a sociedade está clamando por uma mudança no paradigma racial de nosso país.
Entre as exigências, está que o setor privado cumpra sua função social, atuando ativamente pela luta antirracista. Nesse contexto, o papel principal dos líderes no combate ao racismo no mercado de trabalho é formar seus sucessores pretos.
Quer saber como eles podem fazer isso, inclusive, para você conseguir identificar se a empresa em que faz estágio hoje está comprometida com o futuro antirracista? Então, continue a leitura do artigo, que escrevemos especialmente em apoio ao Mês da Consciência Negra.
Racismo estrutural versus Racismo institucional
Antes, porém, vamos esclarecer uma questão que frequentemente gera dúvida. Não, estrutural e institucional não são palavras que podem ser utilizadas como sinônimas quando o assunto é racismo.
Por definição, racismo estrutural são comportamentos individuais que, com o tempo, tornaram-se uma convenção social e que, até hoje, ditam a forma como as pessoas pretas são tratadas em sociedade a partir de ideias pré-concebidas. É caracterizado pelo preconceito velado e não pelos atos de injúria.
Embora também seja “mais sutil” em sua expressão – visto que são igualmente danosos à população –, o racismo institucional se difere do estrutural por ser fruto dele. Entende-se por instituição toda empresa, reitoria de universidade e ministérios públicos onde há poder a ser manipulado em favor próprio e onde decisões tomadas por poucos impactam muitos.
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Ações de combate o racismo para formar líderes pretos no mercado
1) Desenvolver uma cultura organizacional antirracista
A cultura de uma sociedade se dá pelas manifestações sociais que a compõem em menor ou maior escala. Do mesmo modo, constrói-se a cultura de uma organização com uma adaptação dos pilares encontrados dentro de visão, missão e valores.
Em vez de comportamento social, encontramos atitudes e interações no ambiente de trabalho. No lugar de gírias e sotaques, encontramos pautas específicas. E o que corresponde às perspectivas de um povo são as aspirações profissionais de cada time em uma empresa.
Logo, para ser antirracista, o combate interno às próprias posturas preconceituosas de seus integrantes faz-se fundamental. São os líderes que têm mais poder e acesso às pesquisas de clima, e é a partir delas que eles têm a chance de promover mudanças significativas.
Pode-se analisar muito de uma cultura organizacional pela percepção de seus funcionários. Neste caso, aqueles que devem ser levados em consideração são os pretos, pois somente eles são capazes de apontar o que afeta ou não o progresso de sua comunidade.
Introduzir um calendário de eventos comemorativos, aproveitando datas como 21 de março – Dia Internacional da Luta Contra a Discriminação Racial; e novembro – Mês da Consciência Negra é um bom começo. Vale ressaltar que, não basta um post no Instagram da empresa em apoio à causa.
Expressões cuja origem tem o preconceito de raça como fundamento também precisam ser abolidas do vocabulário do dia a dia. Para tanto, a comunicação interna precisa ter autonomia e proatividade para educar todos os colaboradores neste sentido.
Essas datas devem ser utilizadas como momento de reflexão e com atividades educativas. Além disso, prover suporte jurídico e psicológico para que os funcionários atingidos pelo racismo possam registrar suas denúncias e serem acolhidos é outra boa ação em prol da construção de uma cultura organizacional antirracista.
2) Fazer contratações e promoções afirmativas
Enquanto a cultura ainda não foi modificada ou está em estágio inicial, crescendo a passos lentos, há o que se fazer de modo mais enérgico. Assim, resultados de curto e médio prazos são conquistados mais rapidamente.
Caso nenhum programa seja promovido diretamente pelo RH da empresa, a iniciativa pode partir das lideranças que participarão do processo de seleção. Vagas afirmativas são uma forma de reparação histórica pela escravidão.
Quando a abolição foi promulgada em 1888 no Brasil, a população preta não foi ressarcida pelos séculos de crimes cometidos contra ela. Também não houve nenhum tipo de política para incluí-los como força de trabalho assalariada.
Muito pelo contrário. Com o propósito racista de embranquecer o povo brasileiro e para negar o direito dos pretos de receberem por seus esforços, foi incentivada a vinda de imigrantes europeus pelo então governo, movimento que permaneceu forte até dois anos após o fim da Primeira Guerra Mundial.
É por isso que em pleno século 21 ainda vemos discrepâncias como as que foram mencionadas na introdução entre brancos e pretos. Razão pela qual preferir a promoção de funcionários pretos, investindo em sua capacitação, é o ideal para combater o racismo institucional.
Ainda levando em conta o fato de que por vezes pessoas pretas não conseguem desenvolver habilidades práticas por falta de oportunidades. Afinal, desde 2018, elas já são a maioria nas universidades públicas do país, mas representam também 72% dos desempregados.
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3) Criar um comitê de diversidade racial
Esse tópico merece a palavra de alguém que é especialista. Claudia Sender, conselheira na Gerdau, afirmou em uma entrevista: “Diversidade é ser convidada para a festa. Inclusão é ser convidada para dançar.”
Criar um comitê de diversidade racial para que os funcionários pretos proponham campanhas para melhorar o ambiente em que trabalham é convidar para dançar. Ou seja, dar voz e colocar-se na posição de aprendiz quando o assunto é racismo.
Uma das consequências do racismo institucional é o isolamento das pessoas pretas no mercado de trabalho. Ter um espaço em que é possível encontrar seus semelhantes, falar sobre suas lutas diárias e compartilhar experiências também é um avanço que pode ser alcançado por meio de um comitê desse tipo.
[BÔNUS] Fazendo a diferença desde o estágio
E aí? Alguma das ações que listamos aqui está presente na empresa em que você trabalha? Caso sua resposta tenha sido “não”, mas você acredita que há abertura para uma proposta, não tenha medo de dar o primeiro passo!
Monte um argumento baseado em teorias de ESG, cases de sucesso, megatendências e estatísticas do mercado de trabalho atual. Não é preciso esperar ser líder para combater o racismo no mercado de trabalho.
Em suma, profissionais inovadores, proativos e com visão de futuro costumam se destacar na multidão. Então, não perca sua oportunidade e faça do Mês da Consciência Negra uma pauta relevante no seu local de estágio também.
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