Graduação

Saúde da Mulher: o que precisa ser incluído nesta disciplina

O Dia Internacional da Mulher também é sobre as mulheres trans e travestis que, até hoje, não têm sido incluídas nos livros da graduação. Saiba mais!

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Em geral, os cursos de Medicina possuem dois módulos voltados para a atenção integral à saúde da mulher, com uma porção de disciplinas interessantes. São abordados, por exemplo, o ciclo menstrual, os detalhes da formação do feto, as patologias mais comuns, entre outros assuntos essenciais.

Porém, a abordagem atual não é tão inclusiva. E, para o mês da mulher, percebemos que poderíamos esclarecer algumas questões, que você poderá até levar para a sala de aula, para gerar um debate mais aprofundado. Afinal, o dia 8 de março também é sobre os direitos das mulheres trans e travestis, que compõem a nossa sociedade.

Anatomia e embriologia das genitálias [no plural]

Uma das matérias estudadas no módulo inicial de Saúde da Mulher é Anatomia e Embriologia da Genitália Feminina e Mama. Ou seja, trata dos termos sexo e gênero como equivalentes, o que vai contra vários estudos sociológicos e antropológicos modernos e contemporâneos.

Na verdade, não há uma genitália feminina ou masculina, pois existem pessoas transexuais que rompem com esta “regra” dada como biológica. Portanto, o ideal seria que na matéria de anatomia e embriologia, no que tange à mulher, fossem estudadas as duas possibilidades: o pênis e a vagina.

Consulta urológica e exames

Outra matéria que segue o mesmo viés é a Consulta Ginecológica. Em suas aulas, você verá tudo sobre o aparelho reprodutor que inclui útero, trompas uterinas, ovários, óvulos e canal vaginal, entre outras partes. Mas isso não é o suficiente.

Desde o seu ciclo de clínica-escola, você provavelmente entrará em contato com mulheres trans e travestis que, para o devido cuidado de sua saúde, necessitam de uma anamnese diferente da ginecológica. Também deveriam ser ensinadas a disciplina de Consulta Urológica e seus respectivos exames específicos.

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Planejamento familiar, IST e prevenção

Este âmbito de estudo já é amplo e complexo mesmo sem incluir tudo que falaremos a seguir. Mas isso não significa que é difícil mudar o escopo do que é ensinado hoje, e você vai ver que isso é muito necessário. 

A começar pelo planejamento familiar, que não necessariamente será formado por um homem cisgênero e uma mulher cisgênero. Existem outras possibilidades de concepção natural, como entre um casal de lésbicas, sendo uma delas transexual, e entre um casal hétero, sendo a mulher transexual e o homem trans. Neste caso, é ele quem vai ser o gestante da relação.

Atualmente, não se fala sobre essas variáveis que, embora sejam menos frequentes, precisam ser esclarecidas, para que nenhum tratamento contraceptivo seja negligenciado. Isso também vale para a questão das Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST).

Muitas vezes, será no seu consultório que uma paciente vai ter seu primeiro contato com educação sexual. Por este motivo, é fundamental que você saiba qual tipo de preservativo vai realmente protegê-la considerando todas possibilidades de relação sexual e corpos existentes.

Ou seja, não adianta estudar apenas sobre o DIU, a pílula e a camisinha vaginal, entre outros métodos que funcionam somente em mulheres cis. Também é necessário conhecer a vasectomia e a camisinha peniana.

Endocrinologia em corpos transexuais

Mulheres trans e travestis que fazem tratamento hormonal sofrem uma “andropausa forçada”. Como assim? Bom, em homens cisgêneros, a andropausa é um processo natural, que acontece por volta dos 50 anos, devido à redução do nível de produção de testosterona pelos seus organismos.

A mudança causa alterações repentinas de humor, fadiga e diminuição do desejo sexual. Tudo isso pode acometer suas pacientes durante uma idade muito mais jovem, caso elas optem por bloquear a testosterona em seus corpos, buscando efetivar mudanças físicas por meio do uso do estrogênio. 

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Câncer de pênis e de próstata

Dentro do módulo II de Saúde da Mulher são estudados os seguintes tipos de câncer: de mama, de colo de útero e de endométrio. A essa altura você já sabe qual a problemática da questão. Para que a Medicina seja para todas, devem ser incluídas também a análise de casos de câncer de pênis e próstata.

Distúrbios de ereção

Como toda relação sexual é particular, a única regra para que garante um sexo saudável é o consentimento. Assim, pode haver mulheres trans que usam seus pênis para penetração ou não, independentemente do gênero de seus parceiros.

De qualquer forma, a impotência pode ser um problema, e não diz respeito somente a homens cisgêneros. Vários fatores têm potencial para desencadear problemas de ereção, como rotina estressante, pressão alta, depressão, consumo de drogas, ansiedade, etc.

E sabe qual matéria do módulo I auxilia nesta questão? A de Consulta Urológica. O urologista é o profissional mais indicado a solicitar exames, verificar taxas hormonais, investigar a presença de outras doenças e, caso seja necessário, prescrever medicamentos.

Bom, reservamos os dois últimos tópicos para abordar áreas direcionadas somente às mulheres trans e travestis. Então, bora conferir!

Cirurgia de afirmação de gênero

Faz parte da saúde e do bem-estar de muitas mulheres a busca pela afirmação de seu gênero por métodos cirúrgicos. Conhecê-los em detalhe, ou seja, como são feitos, quais são os riscos, suas precauções e quais podem ser as expectativas quanto aos resultados é essencial para o atendimento a qualquer paciente que tenha interesse no assunto. 

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Bloqueadores hormonais

Puberdade anormal é um tema presente na grade curricular das faculdades de Medicina, dentro da disciplina de Saúde da Mulher, geralmente. No entanto, os bloqueadores hormonais para crianças e pré-adolescentes transexuais não é um assunto que costuma vir à tona, a não ser que algum estudante erga a mão e questione sobre o assunto.

Mais populares nos Estados Unidos do que no Brasil, os bloqueadores são um “botão” de pausa na puberdade. Ao contrário do que se pode imaginar, não são promovidas mudanças físicas a partir do seu uso. O que acontece de fato é uma pausa na puberdade, para que a criança com disforia não sofra as mudanças naturais da puberdade.

As consequências para meninas trans, por exemplo, é o não engrossamento da voz, que pode ser irreversível, mesmo com hormonização posterior. Também evita-se o surgimento de pelos na face e outras partes do corpo.

Depois, já em idade de consentimento, os bloqueadores são removidos do tratamento e o adolescente pode escolher iniciar a terapia hormonal para afirmar o seu gênero identitário ou não. Das duas formas, a puberdade “feminina” ou “masculina” acontecerá, seja por vias naturais ou artificiais. 

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